solid words, liquid thoughts

cuca fundida.

Sunday, May 21, 2006

Sobre febres e inseguranças

Pois um dia desses cheguei à infeliz conclusão de que sou movida à estresse. Parece que só consigo ser realmente produtiva sob pressão. Tenho uma capacidade de deixar tudo acumular para ser feito no último instante. Não que eu fique indolente, mas é aquela velha história de deixar um trabalho ocupar o tempo disponível que você tem para realizá-lo.

E aí fico com essa febre de viver e querer tudo ao mesmo tempo. E febre dá sede. Sede insaciável, me faz assumir compromissos demais ao mesmo tempo, até estar prestes a desmoronar sob o peso das obrigações e dos prazos que se aproximam. Minha mãe bem sabe que sofro dessa tendência a me despedaçar e sair flutuando até ser espalhada pelo vento. Tenha calma, ela me diz, que mania de querer tudo. Mas eu não consigo. É fácil pedir calma e perceber que não há necessidade de tanta pressa quando já se viveu muitos anos. Quando se chega à segunda metade da vida, já se cometeu alguns acertos em meio aos erros constantes. Se eu morrer amanhã não terei tido tempo nem de cometer metade dos seus erros, mãe.

Mas não é só isso que me leva a fazer tudo simultaneamente. É que se eu não fizer tudo, não faço nada. É tão fácil permanecer na inércia, a tentação é grande. Talvez eu tenha a esperança da inércia me manter em atividade.

Em boa parte é preguiça, mas também uma dose razoável de medo. Porque eu uso essa maquiagem de durona, mas na verdade estou tremendo. E nunca vai passar, aquele terror antes de pular do precipício. Me sentir suspensa no ar, sem saber se vou cair ou voar, torcendo para o chão ser macio. Toda manhã, ao levantar da cama, é a mesma rotina. O frio na barriga, a vontade de sair correndo. De dormir até os problemas me esquecerem, desistirem de me achar.

De que você tem tanto medo? me perguntou a moça do outro lado do espelho. Do fracasso? eu examinava seu rosto, nem bem adolescente, nem bem mulher, ou do sucesso? Evitei seus olhos e continuei a pentear seus cabelos e escovar os dentes daquele rosto que às vezes gosto, às vezes não. Ela me olhou com reprovação. Eu vi de canto de olho. Ela achou que foi escondido, mas estou até agora com aquele olhar cravado na memória.

Aí eu resolvi pular. O ar não deixa de ser uma outra solução na qual estamos imersos, afinal. Talvez eu bóie.

2 Comments:

  • At 19:57, Blogger Carol / Cóga said…

    Mari, como é bom ver que não estamos sozinhas no mundo, muitas vezes eu sinto isso, de que é mais fácil tocar a vida quando vc se enche tanto de tarefas que não pára para pensar sobre ela. Adorei o "talvez eu bóie" hehehe Bjs

     
  • At 19:22, Blogger Mari said…

    São as principais razões de escrever, né? Catarse e perceber que outras pessoas sentem isso.

     

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